8 de fevereiro de 2013

Carta aberta: E a seca continua


Ascom Senar-PB
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Em recente viagem pelo interior da Paraíba e outros estados do nordeste, pude constatar que, apesar das tentativas estaduais e federais de minimizar as consequências da pior seca dos últimos anos, a situação continua crítica e, infelizmente, de mal a pior. A falta de água e comida é real e preocupante. Se o que aconteceu em 2012 se repetir em 2013, será o fim da agropecuária do nordeste.
No Vale do Piancó, por exemplo, a distribuição de proteinado e outros tipos de ração já não é suficiente para atender a demanda dos produtores rurais. O que se ouve são histórias dos produtores que já perderam mais de 700 cabeças de gado e sobre a produção de leite que era de 17 mil litros/dia e hoje só chega a 3 mil litros/dia.
Em Sousa, a produção caiu de 100 mil litros/dia para apenas 30 mil litros/dia. O Programa Leite da Paraíba que era abastecido com 120 mil litros de leite por dia, atualmente recebe cerca de 10 mil litros/dia.
A estimativa de perda do rebanho era de 40%, hoje a previsão é que as perdas ultrapassem 50% dos animais da Paraíba. Em algumas regiões, 60% do rebanho já desapareceu.
A evasão do campo só cresce. Nada de palpável ou valioso está sendo construído na zona rural, enquanto nas cidades, a construção de loteamentos serve como incentivo para que as pessoas abandonem o campo. A população rural hoje corresponde a 17% da população país. No nordeste, 26% da população está na área rural. Em 2050, apenas 7% da população permanecerá no campo. Quantos sobrarão no nordeste?!
E estas pessoas estão saindo do campo endividadas. Hoje, no nordeste, existem 114.175 produtores com dívida ativa na União. Só na Paraíba, são 5.606 produtores inadimplentes. A inadimplência junto ao Banco do Nordeste (BNB), em todo a região nordeste, chega a R$ 10 bilhões. E, se não houver uma ação do Governo Federal que resolva o passivo do crédito rural da região, que vem acumulando desde os anos 90, volto a repetir, a agropecuária do semiárido e do nordeste acabará de vez.
Sobre a educação é preferível nem falar, pois a situação da maior parte das escolas rurais é decadente, sofrível. E, por favor, me diga como uma população poderia estar preparada para uma catástrofe como esta, se um de seus direitos básicos, que é a educação, lhe é negado?
Os problemas, no entanto, são “disfarçados” pelos programas sociais do Governo Federal, que acabaram com a fome, com a miséria e com a dignidade das pessoas, criando uma legião de acomodados, que estarão, mais uma vez, despreparados para enfrentar as próximas secas. Até quando o país aguentará pagar esta conta? Até quando estas pessoas estarão “protegidas” por este guarda-chuva, ou melhor guarda-sol, que se mostra cada vez mais vulnerável?
Só aqueles que vivem e dependem do campo é que sabem o que estão passando, sem forragem, sem água, sem crédito e endividados. Só quem está vivendo os horrores desta seca, sabe. Só quem está perdendo tudo, inclusive a família, se vendo forçado a enviar seus filhos e esposa para a cidade, sabe. Os produtores rurais do nosso estado e de todo o nordeste sabem. Muitos deles já começam a sofrer de doenças, enfartos, derrames e até mesmos a desistir de suas vidas. E por quê? Por dignidade.
O produtor rural tem brio, orgulho e honra. E a seca tem tirado até mesmo estes valores de muitos deles.
Entre os anos de 1877 e 1878, 500 mil nordestinos morreram de fome, devido a seca. Em 1942 e 1943, milhares de nordestinos, fugindo da falta de água e comida, foram para a Amazônia extrair borracha. Metade deles morreu de malária. O que será feito HOJE para evitar que prejuízos como estes voltem a acontecer?
Estes fatos e muitos outros estão na pauta de reinvindicação elaborada pela Federação da Agricultura e Pecuária da Paraíba e que será entregue para o governador Ricardo Coutinho, durante a audiência que tenho com ele nos próximos dias.
Somamos a estas reivindicações e pedidos desesperados de milhares de produtores do nosso estado, um apelo aos nossos representantes, aos deputados estaduais e federais e senadores, para que eles olhem para a Paraíba e ajude-nos a salvar o que ainda existe.
Viver no semiárido é totalmente possível. Existem, hoje, diversas alternativas viáveis para a sobrevivência nesta região e a pecuária é uma delas. Existem diversos exemplos a serem seguidos, como a Austrália, grande produtor de carne, que possui uma região semiárida onde chove de 200 a 300 ml em apenas 90 dias.
O nordeste tem uma vocação natural para pecuária, especialmente para a produção de leite. Tem referência genética das raças Sindi, Gir, gado mestiço e leiteiro, sem falar nos caprinos. É preciso acabar com a demagogia da distribuição de sementes para os produtores do semiárido. O investimento deve ser na pecuária, com distribuição de animais para os produtores iniciarem seus plantéis.
A distribuição de sementes de capim búfalo e outras variedades resistentes para alimentação animal, investimentos na avicultura e a criação de polos produtores de forragem são outras alternativas.
Volto a pedir às autoridades competentes da Paraíba e do Brasil que acordem para a realidade e escutem as vozes dos milhares de produtores rurais do nordeste, que neste momento, pedem socorro para as autoridades para que não se repita o que foi vivido em 1877. O capital pecuário não é só patrimônio de quem possui, ele é também responsabilidade do Estado.

Mário Borba, presidente da FAEPA
 
Assessoria de Comunicação Social FAEPA/SENAR-PB
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